quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Natal

Todos os anos pensamos numa mensagem diferente
para um dia diferente
e sempre igual ao longo de uns 365 dias de um ano qualquer.
É difícil transmitir a paz,
quando ela se ausenta do nosso imaginário.
É difícil conseguir alcançar o subconsciente
perdido em memórias felizes,
 que a realidade vai cobrindo com o véu do presente
 e erodindo em ventos de futuros ambíguos.
Mas é facílimo desejar-vos Boas Festas e um Natal muito Feliz!
…Mais um Natal!
Mais uma data com marca de água de uma lágrima.
Talvez lágrima de amor.
Talvez lágrima de esperança.
Quem sabe, lágrima feita sorriso.
Ou, quem sabe,
lágrima tocada pelo sol de um novo amanhecer.
Ou do renascer de um espírito ausente.
Por não estar.
Por não querermos.
Ou por esquecermos a sua presença?
Porque ele é constante,
O espírito do Natal.
Porque ele é presente
No nosso coração.
…Ele toca-nos no peito.
Só temos de o sentir!
De saber e querer “ouvi-lo”!

Fernando Magalhães - 2013



sexta-feira, 26 de julho de 2013

Entrega do prémio Lions | Imagina a Paz

Entrega do prémio Lions | No dia nove de Julho de 2013, na escola E.B. 2,3 Dr. Carlos Pinto Ferreira, com a presença do governador do Lions Clube de Vila do Conde, do Professor Davide Oliveira e ainda da Subdiretora deste estabelecimento de ensino, foi entregue o prémio correspondente ao primeiro lugar a nível concelhio e terceiro lugar distrital Norte e Centro, ao aluno do 6.º ano, turma B, Jorge Cunha. Este cartaz vencedor ilustrava o tema a concurso "Imagina a Paz". 

O professor orientador, 
Fernando Magalhães

domingo, 23 de junho de 2013

Uma perspectiva no ensino da Arte

A Última Ceia | Esboço aguarelado 45cmX29,7cm de Fernando Magalhães.


A importância da Arte na formação do aluno/adulto

A Educação Artística começa na infância para se desenvolver e aprofundar ao longo da vida. Favorece a formação da personalidade de um modo harmonioso e saudável, quando abrange a expressão livre e a criatividade (ponto alto da expressão e sinónimo de saúde mental).
A expressão livre revela o ser, quando inteiramente assumida.
A autenticidade da expressão e a criatividade são referências primordiais a respeitar e a estimular, que envolvem os aspetos mais inesperados da imaginação.
Na área de Expressões e concretamente nas disciplinas de Educação Visual e Educação Tecnológica, os alunos são levados a apreciar a permanente influência da Arte na vida e a orientá-los no sentido de entenderem e preservarem os elementos culturais e ambientais que fazem parte do nosso património local e universal.
O professor encaminha-os para experiências criativas e artísticas organizadas de maneira a admitir a escolha individual de acordo com os interesses de cada um e a permitir um enriquecimento gradual e cumulativo.
A meta prioritária das expressões artísticas consiste em ensinar os alunos a utilizar a sua sensibilidade e levá-los a entender o objetivo preponderante da educação artística:
- Tornarem-se uma força criativa e interveniente para construírem uma sociedade melhor.
O processo de ensino que explica a metodologia da educação através da Arte converte-se num meio de desenvolvimento integral do discente e na sua preparação para se transformar num cidadão psicológica e humanamente preparado para em equilíbrio construir um futuro e uma sociedade livres e democráticos.
Efetivamente uma simples linha separa a realidade que temos daquela que pretendemos ter.
O movimento dessa linha tanto se pode transformar no caos de tensões quebradas por interesses extrínsecos e alheios à cultura, como numa linha que conduz a uma espiral progressiva que procura a evolução cultural de um ensino e de um país.
Para chegar a uma forma de contornos definidos temos de abordar a bidimensionalidade e a tridimensionalidade.
A primeira, mais limitada, assemelha-se a um ministério de superfície rígida, incerta, desestruturada e estranhamente hostil.
A segunda, à qual adicionamos a terceira dimensão: o professor exprime outra personalidade que é mais flexibilizante, precisa, calma, ativa e graciosa.
Às formas também lhes podemos conferir movimento, mas algumas delas mantêm-se estáticas, sem dinamismo, conservando uma orientação pesada, numa direção específica e inalterável. Outras são susceptíveis de sugerir uma atividade muito maior, em diferentes direções, expandindo-se no espaço, movimentando-se rumo ao futuro e sempre contrariando as tendências retrógradas, doentias e obsessivas.
Quanto ao espaço e a sua representação do mesmo, a ilusão de profundidade pode ser dada através de sombras, ou de luz e sombra, ou ainda da perspectiva.
A representação desse espaço, como o olho humano o vê, restringe-se unicamente à perspectiva óptica. Esta difere de artista para artista utilizando ou deformando a realidade. Curiosamente neste país há muitos artistas que deformam a realidade, utilizando perspectivas não existentes (as quadradas), deixando por omissão a cónica que tende para um ponto, sempre concordante e aglutinador de uma forma, ou cenário, equilibrado e desejável.
Os artistas persecutórios deste país interpretam o espaço utilizando recursos que variam desde a diminuição de tamanho, artifício muito aproveitado para sugerir profundidade ou separação do cidadão, ou utilização de sobreposições relativamente a tribunais constitucionais e arbitrais, para incutirem a sua perspectiva de afastamento espacial.
Mas, por outro lado, o espaço também pode ser elemento de força emocional, mais do que qualquer objecto ou forma representada, constitui exemplos de concepções artísticas nas quais as formas, ou muitos dos seus pormenores apresentados, são deliberada e conscientemente planeados em lutas e greves com o objetivo de enfatizar o espaço a que se tem direito e a perspectivar valores que assistem aos artistas do ensino em benefício do todo e do conjunto.
A ilusão é sempre mais forte quando se utiliza a perspectiva linear.
A linearidade nunca seduziu artistas plásticos que preferem as linhas curvas anticonvencionais, linhas em desalinho, que com agulha se cozem, esperando que os artistas alinhados no governo se cozam também.

Fernando Magalhães

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Um ovo diferente


Os alunos da turma A do 6.º ano executaram um projeto na disciplina de Educação Visual, para um concurso promovido pela Regina e Imaginar, subordinado ao tema “Um ovo diferente”.
A atividade decorreu de acordo com as expectativas, tendo alguns alunos apresentado nas suas múltiplas abordagens a consecução do seu projeto a concurso.
Devido às dimensões estipuladas no regulamento, o trabalho foi realizado em folha formato A4 e pintado com materiais riscadores: lápis de cor e marcadores.
O aluno número dezoito, do 6.º - A, Tiago Araújo, venceu o primeiro prémio do 5.º ao 7.º ano, a nível concelhio, constituído por um cabaz de chocolates Regina e um livre acesso às Curtinhas (Cinema de Animação para crianças) durante todo o mês de Julho no Cine Teatro de Vila do Conde.


O professor orientador,  Fernando Magalhães

Demissão de adulto

Perante a sociedade, e de acordo com os direitos desconstituídos que me assistem, apresento formalmente o meu pedido de demissão de adulto.
A bem da Nação e de um estado hieraticamente estabelecido, decidi que pretendo regredir no tempo físico e voltar a auferir das responsabilidades e ideias de uma criança de dez anos, no máximo!
PRETENDO ACREDITAR que este mundo é justo e todas as pessoas são honestas e puras.
que os políticos só pretendem o nosso bem e o bem estar social.
que a Troika vem salvar a vida das famílias sem emprego e que passam fome e que o FMI é o Futuro Marcado para a Independência.
QUERO de novo acreditar que tudo é possível, até os sonhos!
que a vida é espantosamente simples de viver e sem complexidades acrescidas.
QUERO apreciar todas as maravilhas da Natureza, sem poluição e sem guerras.
NÃO QUERO mais ver telejornais fatalistas, programas de televisão que são um atentado à inteligência, aos valores morais e à dignidade do mais comum dos seres humanos.
NÃO QUERO fazer contas ao ordenado que ganho e que faço esticar como elástico que rebenta até ao próximo mês.
NÃO QUERO dar valor material às coisas e saber que só com euros as posso ter.
prefiro as moedas de chocolate que me dão prazer ao comê-las e que, com o papel metalizado que as envolve, ainda consigo criar novas formas de construir e brincar.
NÃO QUERO mais dizer um adeus condolente aos amigos que partem e que com eles transportam uma parte da minha vida.
QUERO que a única competição se resuma a um jogo de futebol, onde a alegria de ganhar, ou a tristeza de perder, se transforme num novo jogo de amigos no dia seguinte.
QUERO chapinhar na lama.
QUERO sentir as flores crescerem.
sentir a sombra das árvores,
roubar as maçãs ao vizinho,
trepar muros de aventura,
jogar aos polícias e ladrões, aos índios e aos cowboys, às casinhas e aos médicos,
construir castelos de areia e castelos no ar,
olhar as nuvens e descobrir formas de animais, de gigantes e de naves espaciais.
QUERO saltar de rocha em rocha junto ao riacho.
atirar rasante uma pedra na água e ver quantas vezes ela saltita na superfície antes de se afundar.
QUERO ver amadurecer as primeiras amoras, as primeiras uvas, as primeiras laranjas e prová-las, deixando escorrer o sumo que me suja a roupa.
QUERO voltar a sentir que as chicletes, os gelados e as gomas são os melhores sabores do mundo.
QUERO construir um papagaio de papel e vê-lo voar recortando o céu.
QUERO voltar ao passado em que se é feliz, porque a maldade dos adultos não existe e a ignorância das coisas não nos preocupa ou fere.
QUERO de novo acreditar no poder dos sorrisos e dos abraços, dos beijos e dos mimos, das palavras gentis, da verdade, da justiça, da paz, do amor, dos sonhos e da imaginação.
QUERO sentir tudo de novo, sem artifícios ou mentiras, sem falsidades ou promessas incumpridas…

E para aqueles que, de moto próprio, fizeram o sagrado voto material do esquecimento, ainda quero pensar que toda a infância vale muito mais que o dinheiro.
Demite-te de ser adulto!
Liberta-te da prisão de uma vida agonizante e aborrecida!
O amor é um pássaro verde, num campo azul, no alto da madrugada!”. (Assim escreveu uma criança).

Fernando Magalhães




segunda-feira, 1 de abril de 2013

Mentira



A mentira não existe.

A mentira é a verdade com que nos embalam em urdidos artifícios que não nos deixam pensar e nos remetem para o limbo de uma interrogação desfalecida e desfasada da realidade que conhecemos, mas que desacreditamos por nos fazerem crer.

É tão fácil mentir como fazer acreditar que não se mente.

Os argumentos utilizados são tão verídicos, como as auto defesas que os querem contrariar.

Mentir é sinónimo de ocultação da verdade.

Mas se a verdade não se vê, a mentira existe?

Oculto, por pacatez de de alma, a vontade de gritar ao ver notícias telejornalescas que revolvem entranhas e fazem vomitar vísceras. E, já omiti discursos políticos, futebolísticos e religiosismos fanáticos!

Poderei denunciar aquilo que me revolta mas que arrasta outros que acreditam por verdadeira a mentira camuflada?

Todos os dias ouço, vejo e sinto, a mentira da verdade que me rodeia, do país que habito, da vida que quotidianamente carrego rumo ao infinito de querer ser aquilo, a que, por motivos que a verdade desconhece, me propus ser honestamente.

Será a mentira de viver, ou a verdade a esmorecer nos meandros da sociedade?

A verdade de mentir é como nascer sem ter mãe: não conhecemos os genes, não existe filiação e o que nasceu afinal?

Apenas a ideia de um filho em efémera gestação!

Esta afinal é a mentira de fazer vingar e crescer aquilo que nunca eclodiu. Mas que com publicidade, já chegou à puberdade, sem nunca ter existido!

Para proclamar a mentira, não acreditei em nada daquilo que registei.

Será porventura verdade aquilo que não escrevi?

Para finalizar, manifesto a minha profunda indignação pelas afirmações anteriormente explicitadas.

A mentira é a verdade daquilo que nunca existiu.




Fernando Magalhães
1-4-2013

sexta-feira, 29 de março de 2013

Que ninguém saiba que és um homem



Nunca gostei de ser personagem interveniente nas minhas próprias histórias, que vou construindo com um certo abstracionismo e visão míope de contemplações, registos, deduções ficcionistas e com finalizações que não procuro, mas que aparecem sem as desejar.
Rasgo véus que me transportam à infância.
A música é etérea e envolvente e a vontade de ser pianista, ou lidar com um teclado e reproduzir melodias, era um “light motif” que me perseguia desde os sete anos.
Adiado este sonho - sempre por progenitura máscula, que não contemplava um filho amante da música - nos tempos em que a Mocidade Portuguesa preparava carne para canhão nas guerras coloniais, música que não se transformasse em hinos pseudo heroicos, não era música. Os “terroristas” não se combatiam com acordes musicais, mas com armas.
E, na adolescência, recebeu uma espingarda de caça, com carta de caçador e licença e uso de porte de arma. Tinha quinze anos!
- Não és homem nem és nada se não acertares naquela rola!
A rola voava na transparência de um céu azul e na quietude de um bosque verde de esperança, que rumorejava docemente o respirar das folhas sopradas por aragem de verão.
A espingarda foi levantada, o gatilho premido e o tiro foi cuspido contra uma ave que riscava o horizonte e que, desajeitadamente sacudida, desceu em espiral de derradeiro voo e caiu próxima dos nossos pés.
Reparei que ainda se agitava em último assomo de vida. Sem piedade e pegando no ferido pássaro, bateu-lhe com a cabeça num esteio granítico de vinha, matando-o.
- Devias ser tu a fazer isto, já que não lhe acertaste como devia ser!...
- Não sou homem para isso! – pensei repudiando tal atitude.
A partir desse momento decidi que nunca mais atiraria sobre qualquer animal. A emoção de esgrimir uma arma não me permitia pôr fim a uma vida. Aves como galinholas, perdizes, patos bravos, ou mamíferos como coelhos, lebres, ou javalis, foram riscados da minha carta de “caçador”.
No entanto, apareciam frente aos meus olhos, perante a mira da minha espingarda, e a minha atuação, para não levar reprimenda, era disparar para o lado, de maneira a que o leque de chumbo dum cartucho, calibre 16, nunca acertasse.
As censuras sucediam-se: - Um coelho à tua frente e não lhe acertaste! Uma perdiz a dois metros e não tiveste pontaria?
(Vou fazer aqui uma pausa e tomar um café!...)

Guardava comigo a vontade de não ser homem como queriam que fosse. Deixar os animais viverem e continuarem a sua senda de liberdade e procriação. Esta sensação alegrava-me a alma e preenchia-me o ego! Sentia-me feliz pelo equilíbrio que me inundava a alma e que pensava se repercutisse no Universo!
Afinal a Natureza é única!
Caçar não é um desporto, é uma alienação primária e egocêntrica. Compreenderia se nos encontrássemos em tempos pré-históricos e necessitássemos de caçar para sobreviver, mas filhos da cidade? Que desporto tão cruel pode trazer prazer a um humano dito civilizado?
Morreu aqui a minha história de caçador sem nunca o ter sido e abominando tais práticas.
Mais tarde, transportado por mãos amigas para um clube de tiro, dediquei-me a praticar tiro aos pratos, tendo ganho como júnior alguns prémios.
Na era do fascismo, em Portugal, os jornais, censurados a lápis azul, apenas documentavam notícias sem interesse, omitindo as greves e manifestações de trabalhadores ou estudantes, lutando por melhores condições de trabalho, vida, liberdade, ou ensino. Todas elas eram sanadas e remetidas ao silêncio pelas bastonadas da polícia e encarceramentos pidescos, que muitas vezes levavam à morte, devido às torturas e sevícias perpetradas.
Notícias como vencer um jogo internacional, um campeonato nacional de futebol, festivais da canção, fado no estrangeiro, mortes súbitas e mortais, ou peregrinações a Fátima, faziam as parangonas dos periódicos.
Num artigo de oitavo de página, aparecia um adolescente que tinha alcançado o primeiro lugar num concurso de tiro aos pratos.
A revolução instalou-se no ambiente familiar.
(…As minhas desculpas mas apetece-me fumar um cigarro! Volto dentro de momentos!)

- Então tu, que não acertavas num coelho que te saltava aos pés ganhas um concurso de tiro aos pratos que é muito mais difícil de acertar? – e, juntando as palavras à ação, uma tremenda estalada voou marcando-lhe a face de carmim.
Não se sentiu homem para responder e desapareceu dorido para a quietude do quarto, onde o abraço sempre presente de um livro, neste caso o “Adeus às Armas” de Ernest Hemingway, o esperava.
(Por favor aguardem uns minutos, ainda estou a ler e a digerir alguns excertos!)

A espingarda, uma Saint-Étienne de canos sobrepostos, acabou por ser o passaporte para uma licenciatura pós 25 de abril, após ser vendida para ir pagando as propinas.
Na faculdade, onde entrou em 1974, aprendeu, entre outras coisas, judo para defesa pessoal e a fabricar cocktails Molotov. A situação era muito indefinida e temia-se a toda a hora o acordar da Maioria Silenciosa de extrema-direita.
Com algumas pequenas escaramuças, mais verbais e sitiantes que físicas, espreitando contudo assaltos a sedes de partidos de extrema-esquerda, o prec passou, reduzindo, mas não calando na sua vontade, o eco da revolução.
A escola era única em termos de conceitos e de liberdade. A tentativa de fazer renascer uma nova Bauhaus, respirava em todas as paredes, jardins e cantina. O intercâmbio cultural a nível de todas as artes, assim como o sexualmente assumido, respiravam o ar fresco com perfume a primavera há tanto tempo esquecido.
Conheceu e intimamente e conviveu com várias colegas. Permanecem amizades que, de uma forma saudável e concreta ainda sobrevivem. Foi confidente, conselheiro, amigo e amante.
(A nostalgia, nestes momentos, toma conta de nós e por vezes, uma lágrima rebelde, teima em aparecer… há histórias da vida que nunca se esquecem e momentos que sempre permanecerão indelevelmente gravados na nossa alma! Desculpem mais este silêncio narrativo!)

- Estou grávida do Simão. Sabes como é o meu pai. Se soubesse, matava-me de pancada!
Ele sabia perfeitamente como o pai dela era: a escola tinha sido a mesma do seu.
Olhou para ela, era uma moça muito bonita (desejada por muitos colegas e até professores), que os pais, de ambas as partes gostariam de ver como uma futura união permanente. No entanto, a relação entre ambos resumia-se a um amor fraternal, conivente nas pequenas coisas da vida, nos bons e maus momentos, nas relações que tinham e que sem pudor relatavam um ao outro. Amizade não ultrapassável para outro patamar. Amigos leais e eternos!
- Que pensas fazer?
-Tenho que abortar!
- Já pensaste bem nisso, Ariane, já falaste com o Simão?
- É da mesma opinião! Como estudantes e sem trabalho não temos futuro para criar um filho!
- Como é que vais fazer o aborto? Conheces alguém que o faça, tens dinheiro?
- Não, não conheço ninguém, sei a quem posso recorrer para arranjar o dinheiro e depois pagar com a minha mesada, mas por favor vê se conheces alguma pessoa que me faça isto!
- Ariane, estás plenamente convencida que essa é a melhor maneira de resolver as coisas?
- Mas que outra alternativa vês?... – e lágrimas caudalosas escorriam dos seus belos olhos negros.
- Tudo bem, como teu amigo vou tentar resolver a situação! – as lágrimas também estavam prestes a saltar - Agradeço-te a tua confiança, mas muito francamente não me sinto nada bem neste papel!
- Por favor ajuda-me!...
(Novo interregno no passado, nova paragem para beber um copo de água e engolir a dor e interrogações que me assaltavam. Seria homem para solucionar tal feito?)
Lembrou-se de um colega de curso mais velho, que locutor na televisão, lhe pareceu ter conhecimentos suficientes para apontar um caminho que embora sinuoso, poderia conduzir a uma solução.
Apresentou-se como presumível autor do feito, ou do feto, e aconselhou-se quanto a uma solução que não sendo do seu agrado, mas atendendo às premissas familiares não tinha opções para vingar.
Indicou-lhe um médico numa clínica da cidade que o faria em troco do pagamento que cobrava na altura. Casado, mas com uma aventura fortuita, já tinha recorrido a ele.
Agradeceu e encontrou-se com Ariane para lhe dar conta das suas indagações.
- Já sabes como proceder, fala com o Simão! – e despediu-se com um beijo.
- Obrigada! – reconheceu retribuindo-lhe o beijo. – És o meu maior e mais precioso amigo!
(Nova pausa, neste momento exigível para a sequência da narrativa. Vou até à rua apanhar um pouco de ar fresco! Aproveito para levar o meu cão a passear.)

-Vens comigo à Clínica?
- Eu, a que propósito, o Simão não vai contigo?
- Diz que não se sente com coragem!
- Então ele fez-te o filho e não é homem para te acompanhar num momento tão delicado como este?
- Ele diz que não consegue... Por favor, vem comigo...
E ele foi.
Já não sabe que desculpa deu à namorada para não estar com ela naquela tarde, mas foi…
Subiram no ascensor até ao quarto andar.
Disseram à rececionista que a consulta já estava marcada.
Ariane apertava-lhe a mão que ele sentiu húmida, abandonada e tremente de apreensão.
- Podem entrar, o Doutor espera-os! – disse numa voz impessoal olhando-os por cima dos óculos bifocais.
Caminharam de mãos dadas uns escassos metros que pareceram quilómetros.
A porta abriu-se.
Uma figura longilínea de bata branca, convidou-os a entrar.
No interior do branco consultório, onde se vislumbrava uma cama de parturiente, com aparelhos metálicos que se elevavam no ar, aparecia hirta e expectante uma enfermeira também de branco vestida.
O médico, com ar severo olhou para ele.
- Têm a certeza do que querem fazer?
- Sim, alternativas não existem neste momento! – conseguiu articular.
- E não tem vergonha! Não sabe que existem mesmo alternativas como os contracetivos, os preservativos? As camisinhas, como os jovens lhes chamam? Faço isto, mas não é com agrado, já reparou que vai fazer com que uma nova vida deixe de existir?
Engoliu em seco. Nada tinha a ver com a situação e ridiculamente estava a ser enxovalhado passando por ser o autor de uma peça não escrita pela sua mão, ou neste caso por outro membro!
Embora amigo do Simão, naquele momento odiou-o de morte e lamentou seriamente a sorte de Ariane.
- Pronto, pode sair, agora é connosco!
Senti-me ferido no mais profundo da minha dignidade. Era como se tivesse sido o autor da gravidez indesejada. O futuro pai de uma criança que teria gostado de ter. O homem que na realidade não o era e que, naquele consultório imaculadamente branco, numa avenida central, ninguém sabia o que era ser homem!
Desci no ascensor e, sentando-me na primeira mesa do primeiro café que encontrei, pedi duas cervejas: uma para mim, outra para brindar comigo próprio!


Fernando Magalhães
29-03-2013


quinta-feira, 21 de março de 2013

O amor é como música

O amor é como música
em sinfonia inacabda
onde as notas se soltam
rodopiam
envolvem-nos
transportam-nos em acordes de sonhos
e cânticos de anjos.
O amor é uma dança
Ballet vaporoso em "pas-de-deux"
ou movimento nativo gerado da terra
mas não deixa de ser dança
palpitante
passo a passo
em que os corpos se enlaçam
ao ritmo do coração.
O amor é uma pintura
em cores que a vida combina
paisagens da natureza
ou corpos nus que se unem.
O amor é toda arte
que as próprias artes engana
é cantado em todas elas
mas não é catalogado.
O amor é uma flor
é uma montanha de esperança
é vulcão quente de dor
é mar alto sem bonança.
O amor é tudo o que não sei dizer... 

Fernando Magalhães

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A Máscara


Olho-me ao espelho:
- O reflexo que vi ontem aparenta o mesmo aspeto de hoje.
No entanto há fotografias em casa, de há muitos anos atrás e, embora me reconheça por ter existido, a figura impressa revela uma outra que já existiu.
Na aparência que se transformou, não existe no íntimo mutações intransponíveis. Sei que sou esse, sem mistérios ou transmutações. Eu, quando era, quando fui e enquanto sou.
Nos embates diários da vida, teria sido aquela imagem estagnada em papel, sempre a mesma?
Procuro-me no tempo e descubro que assumi outras faces, outros retratos, outros esgares, outras posturas de olhos e semblantes, de acordo com predisposições, embates, discursos, encontros fortuitos, entrevistas, conquistas de amor, perdas com dor ou sem ela, paternidades de educação e insolvências de querer ser aquilo que não sou.
Máscaras!
Apenas máscaras que se desdobram no quotidiano das coisas sem valor e dos acontecimentos que temos de valorizar.
Assumo as consequências de sobrolho franzido, quando o orgulho não me permite voltar atrás.
Arqueio sobrancelhas interrogativas, quando não existe uma resposta que me elucide.
Arregalo os olhos, quando a dúvida se instala e instiga a uma débil e não fundamentada afirmação.
Mostro dentes de raiva, quando me ofendem sem razão.
Os olhos saltam das órbitas e a boca abre-se de estupor, quando a agressividade me atinge.
...Tanta máscara em tão pouco rosto!...
Tantos rostos diferentes numa cara só!
É a máscara!
Que usamos sem darmos conta no quotidiano absurdo que se instala no espírito.
Nas tragédias que não são gregas, nas comédias que não são carnavais.
É a máscara da origem do ser!
Da cosmogonia que pretendemos alcançar!
Máscara que sou eu sem saberes se és tu!
Interrogativamente efémera e sem explicação.
Catarse de alma e catalepsia de estar.
Máscara de todos os dias, que um carnaval não explica, pela simples e mera razão de se usar uma máscara que não é a nossa!


Fernando Magalhães 08/02/2013

Um amigo não é um conhecido


Um amigo não é um conhecido.
é um igual.
Um amigo não é um companheiro.
é a união.
Um amigo não é a relação.
é uma franqueza.
Um amigo não é uma muleta,
é a força.
Um amigo não é um fardo,
é a leveza do ser.
Um amigo não é um confidente,
é o segredo.
Um amigo não é a questão,
é a solução.
Mas um amigo não é só a solução,
é a compreensão.
Um amigo não questiona,
é a resposta.
Um amigo não empresta,
apenas dá.
Mas um amigo não é só o que dá,
é o que ensina.
Um amigo não se assume,
um amigo é.
Um amigo não se encontra,
aparece.
Um amigo não se escolhe,
grava-se no coração.
Um amigo não se insinua.
espalha ternura.
Um amigo não discute,
aponta caminhos.
Um amigo não chora,
enxuga as lágrimas.
Um amigo não exige,
aceita.
Mas um amigo também se perde, nas nuvens, ao sabor do vento,
em anos, dias e horas,
de chuva, neve e calor,
mas volta na primavera…
e mesmo perdido nos sonhos,
da infância à eternidade,
um amigo não tem tempo,
nem idade,
nem idade,
nem momento,
um amigo é a saudade,
um amigo é o presente
que procuro sempre…
e sempre,
até que o amor esgote,
até que a alma rebente.

Fernando Magalhães 09-10-1998